Vivemos, segundo Alain Badiou, uma “crise da negação” que diz respeito as políticas tradicionais da esquerda. Ela se mostra da redução da política na “oposição democrática” típica da esquerda fukuyamista hoje dominante que postula a democracia-liberal como horizonte ontológico da humanidade. Badiou propõem uma nova articulação entre destruição negativa e subtração que difere do modelo clássico da luta de classes da esquerda histórica. Enquanto a tradição leninista do século XX tinha como horizonte a idéia que a destruição poderia abrir uma nova história, o desafio que temos hoje uma “subtração” que seja capaz de criar um novo espaço autônomo e independente das leis dominantes da situação. A questão é que hoje a parte da negação não é mais capaz de criar o novo.
Badiou salienta a necessidade de pensarmos a política contemporânea para além da dominação de lugares, social, nacional, racial, de gênero e religião. Uma política descentralizada com a igualdade absoluta como seu conceito-motor: uma “ação sem espaço”. O objetivo é uma forma de ação política em que a existência de todos não esteja separada de seu ser num ponto em que nossa existência seja tão intensa que esqueçamos nossa divisão interna. O resultado é nos tornarmos parte de um novo sujeito.
Essas novas políticas de emancipação hoje diizem dizem respeito a o que a Organisation Politique chama de “distancia do Estado”. Ela significa que o processo político e suas decisões devem ser construídas independentemente do que o Estado considera importante. O Estado aqui é entendido numa noção ampliada que inclui o governo, a mídia e até aqueles que tomam as decisões econômicas. Quando se deixa que o processo política seja dominado pelo Estado, já se perdeu o jogo. Assim, “distancia do Estado” significa que a política não seja estruturada ou polarizada pela agenda fixada pelo Estado – eleições, intervenções em conflitos, guerra a outro Estado, quando o Estado declara que por uma crise econômica certas ações são impossíveis. Essas “convocações do Estado” que controlam o tempo dos eventos políticos impossibilitam uma “independência” das práticas políticas.
Segundo Badiou as limitações do Estado-Partido foram profundas – o que os trotskistas chamaram de burocratismo, os anarquistas de estado terrorista e os maoístas de revisionismo. Da perspectiva de tomar o poder o partido foi vitorioso enquanto na perspectiva de exercer o poder foi um fracasso. Por isso, “nós estamos numa fase que devemos estar além da questão do partido como modelo de organização. Esse modelo resolveu os problemas do século XIX, mas nós devemos resolver os problemas do XX”.
“A forma de organização hoje deveria ser, na minha opinião, menos articulada diretamente com ou pela questão do Estado e poder. O modelo de partido centralizado tornou possível uma nova forma de poder que não tinha nada menos que o poder do Partido em si. Nós estamos agora sob o que chamo de “distancia do Estado”. Isso é o primeiro de tudo porque a questão do poder não é mais ‘imediata”: em nenhum lugar “tomar o poder” de forma insurrecional parece possível hoje. Nós deveríamos buscar uma nova forma. Meus amigos e eu na “Organização Política” chamamos isso de “política sem partido”. Essa é uma caracterização da situação completamente descritiva e negativa. Isso significa simplesmente que não queremos entrar numa forma de organização que é totalmente articulada pelo Estado. Tanto a forma insurrecional do partido como a forma eleitoral hoje são articuladas pelo Estado. Em ambos os casos o partido é subordinado a questão do poder e do Estado. Eu penso que nós deveríamos quebrar com essa subordinação e, em última instância, engajar organizações políticas (de qualquer forma que tome) no processo político que são independentes do – “subtraídas” – poder e do Estado. Diferentemente da forma de partido insurrecional, essa política de subtração não é mais imediatamente destrutiva, antagônica ou militarizada (tradução minha).
Mas haverá mesmo alguma independência pura do Estado que não seja politicamente estéril? Ou, se esquecendo d partido não haveria uma política sem política?
De qualquer forma minha certeza é que com o fim do “período de férias do capitalismo”, principalmente com o 11 de setembro e a crise financeira de 2008, coloca-se em questão uma nova sequencia política para além da democracia-liberal como horizonte de ação. Ao partimos a uma ofensiva socialista ou cada vez mais veremos as antigas estratégias serem completamente anacronicas diante dos desafios que temos hoje.
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