domingo, 28 de fevereiro de 2010

Estado de emergência fiscal

Estamos entrando numa nova etapa do capitalismo mundial com o aprofundamento da crise estrutural do capital. O Estado forte e autoritário está novamente emergindo numa espécie de “chineização do Estado liberal” conjuntamente com o processo de “japoneização do trabalho”. A democracia poderá continuar formalmente (como sempre ocorreu), mas as decisões chaves para a sustentação da economia mundial estão tendo, cada vez mais, um caráter autoritário pelo ímpeto de administrar a atual crise. Um dos fatores essenciais da reprodução do capital se torna a necessária “ajuda externa” do Estado que, quando preciso, suspende a ordem democrática em nome das “prioridades econômicas”. Torna-se escancarada a ligação incestuosa do Estado capitalista com o “mundo parasitário das finanças”. O Estado age no que é “perigoso” para a estabilidade do sistema financeiro (mas não só nele) com seus “financiamentos de emergência”, seja nacionalizando bancos como o Northern Rock na Inglaterra e a AIG nos EUA ou na ajuda dos financiamentos de compra do Bear Stearns pela JPMorgan Chase com um pequeno empréstimo de US$ 29 bilhões do governo norte-americano, sem garantia nenhuma além de seus títulos de propriedade. Em outras palavras, o Estado é a última instância de salvamento da bancarrota capitalista.



A pergunta que fica é: até quando o Estado terá condições de salvar as empresas capitalistas (da produção aos bancos, da agricultura a dívida) diante das dimensões atuais da crise? E, no caso dos EUA e alguns outros, até quando essas iniciativas poderão continuar sem se encontrar drasticamente com o crescente endividamento que, a cada dia, percebemos ser impagável?



O que venho defendendo faz alguns anos é que com a dependência sempre crescente do capital de “ajuda externa” do Estado estamos nos aproximando de um limite sistêmico, pois somos obrigados a enfrentar a insuficiência crônica de ajuda externa referente àquilo que o Estado tem condições de oferecer. Os bilhões de gastos pelos Estados para "sair da crise" permitiu que uma profunda depressão se tornasse temporariamente uma recessão econômica. Nesse momento muitos proclamaram (sem fundamentos) que “o pior já passou”. O resultado dessa injeção imensa de quantias para socorrer o capitalismo atenuou durante alguns meses a evolução da crise sistêmica global, mas a “ajuda externa” do Estado não é eterna. Pela impossibilidade de manter essas medidas paliativas, o “congelamento” da crise no segundo semestre de 2009 está prestes ao fim. Segundo o “Relatório sobre a estabilidade financeira mundial” do Fundo Monetário Internacional, apenas em 2008, os salvamentos dados pelos bancos centrais e governos dos Estados Unidos, Reino Unido e zona do euro chegou a US$ 9 trilhões, dos quais US$ 4,5 trilhões em forma de garantia.



Sabemos que a “ajuda externa” do Estado como essa possui a instrumentalidade de ajudar temporariamente o sistema, mas historicamente é sempre insuficiente para o objetivo de garantir de forma permanente a estabilidade social e internacional, além de marcar profundamente a crescente simbiose entre capital e Estado de maneira irretornável deixa de forma explícita a conformidade de interesses “sociais” de ambos para a reprodução do sistema do capital.



O desdobramento da atual crise constata um aumento do desemprego, a precarização do trabalho, o esgotamento dos benefícios sociais, baixa de salários, colapso de serviços públicos e, não menos importante, uma crise fiscal dos Estados sem precedentes na história do capitalismo mundial. Podemos enfatizar que vivemos numa era de estado de emergência fiscal em que a explosão do déficit público é eminente. Passando do Brasil ao Japão, dos Estados Unidos a Grã-Bretanha, da Grécia a Rússia, da Letônia a Islândia, da Austrália a Marrocos, estamos presenciando um aumento brutal do endividamento público que torna o pagamento dessa dívidas matematicamente impagáveis.

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