segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Sobre o “Modo PSOL de Governar”



Depois de oito anos, o PSOL vai pela primeira vez ocupar cargos no Executivo. É evidente que temos dificuldades em relação a uma definição mais cabal sobre o significado e o caráter do “modo PSOL de governar”, afinal, é a partir de janeiro de 2013 que o PSOL dará início às suas primeiras experiências de governo frente às prefeituras de Macapá (AP) e Itaocara (RJ). É por isso que o debate sobre o significado do modo PSOL de governar é um debate estratégico para nós.

O que é um “bom governo” do PSOL? A burguesia permitirá que o PSOL governe nessas cidades? Caso assumamos o governo municipal, em que os governos executivos do PSOL devem se focar? O partido aplicará um programa “socialista”? Ou ainda, quais serão as diferenças entre um “bom governo” do PSOL e outro qualquer? Como estarão integrados os governos do PSOL na formação de uma base política sólida para um projeto estratégico socialista, que deve ser a tarefa central do nosso partido? Como ligar os esforços de um governo municipal à luta política estadual e nacional?

Não existe qualquer experiência histórica de controle público do patrimônio privado das cidades e apropriação dos excedentes econômicos para fins públicos que tenha sido efetivada sem uma revolução. Qualquer governo majoritariamente de esquerda numa cidade em que predomina o modo capitalista de produção e em que a revolução socialista não está na ordem do dia deve ter claro que um programa de governo não vai executar medidas e ações típicas de governos e Estados resultantes de revoluções. É provável que alguns participantes dessa parte da esquerda acreditem que a eleição de um governo de esquerda seja capaz de transformar uma vitória eleitoral numa revolução pacífica. Se acreditam nisso, provavelmente ficariam frustrados e encarariam os resultados de nosso governo como uma traição.

É claro que ganhar uma eleição municipal não é uma “revolução”. Entretanto, é possível que as tentativas de boicote ao governo possam incitar um grande processo de mobilização popular. É provável que um “modo PSOL de governar” só possa vingar criando espaços para acelerar a conscientização do povo acerca dos problemas políticos que inviabilizam o avanço do governo bem como o desenvolvimento de formas de produzir e socializar riqueza.

Em primeiro lugar, o “modo PSOL de governar” deve ser uma luta coletiva na qual o próprio governo assume, necessariamente, o caráter de instrumento político de construção do poder popular. Um governo do PSOL não pode abrir mão de, por dentro da estrutura do governo, possibilitar os mais amplos espaços para a participação do povo, para o debate democrático, para o controle popular do Estado, para a construção, pelo povo na luta, do poder popular. Em nossos governos devemos mostrar que ao ocupar espaços no aparelho de Estado temos de criar todos os mecanismos possíveis para o aprofundamento, para a radicalização democrática como condição imprescindível à garantia de governabilidade de nossos governos. Nesse sentido, a participação popular deve ser marca de um modo PSOL de governar, pois não haverá hegemonia política se apenas construirmos o partido e governarmos com controle social, se não impulsionarmos a sociedade para que ela se auto-organize e eleve seu padrão cultural, de informação e de renda. Temos de combinar construção partidária com governo, com dinâmica de auto-organização da sociedade e com reforma do poder político-institucional. O orçamento participativo é apenas uma parte, mas o foco deve ser em fazer uma verdadeira “revolução cultural”. Teremos de pôr o dedo no problema das câmaras municipais e do Poder Legislativo. Estimular com que o povo perca o medo de mandar nos políticos acompanhando suas votações e deliberações, até começar a discutir o controle da mídia, o poder econômico, o clientelismo, a compra de votos. Portanto, o objetivo do “modo PSOL de governar” é colocar o povo na ofensiva, organizá-lo para resolver diretamente os seus problemas com o auxílio do aparelho estatal.

Em segundo lugar, um governo do PSOL deve se focar em realizar medidas de emergência que corrijam as violentas contradições sociais, reorientando os orçamentos públicos no sentido de dar alimentação, saúde, habitação, escola, emprego e transporte à população. Com o desenvolver destas medidas e com as forças adquiridas deste processo, o governo deve iniciar uma política planejada visando o desenvolvimento do conjunto das forças produtivas, isolando os inimigos, criando conselhos populares, gerando empregos qualificados e construindo formas de propriedade estatal e coletiva. Um governo do PSOL não deve se furtar de desenvolver as forças produtivas, isto é, as ciências, tecnologias, cadeias industriais, infraestrutura de transportes, energia e comunicações e a capacidade educacional e técnica da força de trabalho, e quanto mais ampliar a presença da propriedade estatal e pública na sociedade para estruturar cadeias produtivas completas ou quase completas nas cidades.

         Estas medidas possibilitariam com que um governo dirigido pelo PSOL pudesse delinear um caminho de desenvolvimento que não seja exclusivamente capitalista – bem como as medidas emergenciais necessárias que melhores as condições de vida do povo. Fazendo parte de um governo executivo, o PSOL deveria se focar em avançar na criação de condições para a transformação social, eles terão de desenvolver, em termos políticos, a descentralização do poder político e, em termos econômicos, as formas de propriedade que trazem em germe a possibilidade de sua transformação em formas socialistas. O elo entre estas transformações é impulsionar uma “revolução cultural”, para fazer avançar a consciência popular e defender o governo diante dos boicotes da burguesia.

         Obviamente, não se trata de um experimento simples, mas pode ser um caminho de construção do socialismo instigado pelo PSOL no governo. É preciso ter coragem e serenidade para assumir a responsabilidade de produzir um “modo PSOL de governar”, pois não há mais tempo e nem motivo de ter medo de ser governo. 

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