É possível um caminho pós-neoliberal com características
européias?
As
últimas eleições na Europa estão deixando claro
que os partidos social-democratas não serão capazes de dar o salto ao
pós-neoliberalismo com características européias. Isso num momento de rejeição
generalizada ao modelo neoliberal de austeridade. A direita e a “esquerda” que
apóiam os pacotes de austeridade estão perdendo apoio popular culminando em
isolamento e derrotas políticas.
É certo que o modelo neoliberal está numa profunda crise.
Coloca-se em questão uma nova seqüência política para além do neoliberalismo
como horizonte de ação sob novas formas de organização social. Na caso europeu,
encontramos uma encruzilhada histórica. As recentes mobilizações em países como
Grécia, Espanha, Inglaterra e França estão dizendo em alto e bom som um
“Basta!” às políticas de austeridade neoliberais que tendem a destruir o Estado
de Bem Estar Social construído a partir do pós-guerra. Por hora não se sabe em
que direção avançar.
Como o problema em cada país está relacionado com um novo
projeto europeu, ainda não despontaram alternativas continentais. Os novos
governos podem, entretanto, ajudar a construir um novo consenso pós-neoliberal
de oposição ao projeto encabeçado pela Alemanha de austeridade. A situação se
agrava pelo rápido processo de repolitização da extrema-direita que ganha novos
adeptos e movimentações continentais.
No caso da Grécia, os dois partidos pró-austeridade,
o Pasok e a Nova Democracia, que governam juntos desde o fim de 2011, sofreram uma
grande derrota, conseguindo apenas 32,4% dos votos nas eleições legislativas.
Nas últimas eleições legislativas, em 2009, ambos os partidos que obtiveram juntos
77,4%. Com esse resultado, será quase impossível a formação de um novo governo
de coalizão que mantenha a austeridade ditada pela União Européia e pelo Fundo
Monetário Internacional (FMI). Os
vencedores foram, por um lado, a esquerda radical da Syriza, contrária ao
memorando de acordo da Grécia com os credores do país, que passa a ser a
segunda força política do país, e, por outro lado, o partido neonazista Chryssi
Avghi (Amanhecer dourado), que conquista importantes espaços no Parlamento pela
primeira vez. São novas polarizações e novos inimigos políticos à vista.
Mas como poderia ser articulado o pós-neoliberalismo com
características européias? Em primeiro lugar, vale lembrar que a crise européia
não é apenas uma crise do neoliberalismo, como se fosse possível um resgate do
ideário regulado keynesiano conciliando crescimento econômico e bem-estar
social. Em segundo lugar, parece não haver saída para um crescimento econômico
contra a austeridade sem retomar o processo de financeirização, o que apenas
adia os reais problemas além de acumular novas contradições e abrir espaço para
propostas da extrema-direita. Este é o pepino de Hollande que disse que aceita
o pacto fiscal de austeridade assinado em março, mas que também deseja um outro
acordo pró-crescimento. Crescimento para que e para quem? Em suma, o que poderia ser um projeto
pós-neoliberal num país em que o desenvolvimento capitalista bateu no teto?
Como saída, as forças pós-neoliberais na Europa poderiam
impulsionar um movimento reverso das políticas de privatização, incluindo como
ações a “estatização” de setores estratégicos de reprodução da sociedade com o
objetivo de democratização do Estado, indo na contra-corrente da realpolitik
européia desde o pós-guerra. Ainda não se vê como ligar a política com o povo.
Tudo se passa como se a política fosse feita apenas por profissionais que estão
enormemente distantes das ruas. Existe um medo generalizado de dar o passo
crucial da politização, do risco inerente em querer modificar as regras do
jogo.
O que
está ficando claro é que o pós-neoliberalismo com características européia
necessita de um projeto econômico político, algo que misture o desenvolvimento da
organização popular com a promoção diversas
formas de propriedade social, desde empresas cooperativas até empresas estatais
e associações destas com capitais privados, passando por um amplo leque de
formas intermediárias nas quais trabalhadores, consumidores e técnicos estatais
se combinem de diversas formas para engendrar novas relações de propriedade
sujeitas ao controle popular, sem confundir propriedade pública com propriedade
estatal. Em suma, o desafio europeu é desenvolver um pós-neoliberalismo cujo
caminho de desenvolvimento que não seja exclusivamente capitalista que avance
na criação de formas socialistas de propriedades.
O
objetivo é uma transição em que o capital se oponha a este processo com uma
posição historicamente retrógrada e insustentável devido ao dinamismo das
propriedades públicas, estatais e não estatais, com um sistema orgânico entre
produção e distribuição, descentralização do poder político e radical
transcendência da divisão social hierárquica do trabalho.
Com
a exacerbação da crise e de novos contornos geopolíticos nos últimos anos
podemos afirmar que a complacência do período pós-Guerra Fria está finalmente
acabando e que estamos vivendo um retorno das discussões sobre as alternativas
ao capitalismo. Como sair da crise e iniciar um processo de transição a uma
sociedade radicalmente distinta? A idéia de um “capitalismo mais humano” com
preocupações ecológicas e sociais demonstra a cada dia ser a maior utopia
irrealizável. Encontrar uma alternativa viável e desejável ao capitalismo está
deixando de ser algo utópico para se converter numa urgência histórica, a
“crise terminal” do socialismo está passando a ser uma crise momentânea que
demanda novas elaborações e práticas políticas.
Afinal,
será possível um pós-neoliberalismo que socialize os meios de produção na
Europa?
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