terça-feira, 26 de outubro de 2010

Dilma sem ilusões

Nestas eleições presidenciais de segundo turno no Brasil vale perfeitamente o cutuque de Zizek: “com essa esquerda quem precisa de direita?”.



O governo Lula re-configurou o capitalismo, as relações de classe, a esquerda, a política e a história do Brasil. Como bem disse Lula “como o Brasil era uma economia capitalista se não tinha crédito? Precisou entrar um metalúrgico socialista para transformar esse país num país capitalista”. Houve a instalação da pós-política democrática pluriclassista “fukuyamista” como discurso nacional oficial numa estranha mistura de gestão dos interesses privados (nacionais e internacionais) com o fim da história política sob a figura do PT no poder.



Algumas pessoas me perguntam: “e aí, como vai ser no segundo turno?”. Entre aqueles que estão pendendo para o Serra enfatizo a necessidade do voto nulo. Para aqueles que são Dilma digo que a melhor posição é “Dilma sem ilusões”. Ok, Dilma tende a ser melhor que Serra. Mas, por favor, não vamos nos iludir que Dilma vai descriminalizar o movimento social e a pobreza, que vai modificar a política macroeconômica baseada em especulação e altos juros. Não devemos ter ilusões. Dilma é uma grande incentivadora da autonomia do Banco Central, de altos investimentos no Agronegócio e despejos para a Copa do Mundo. É Dilma, ok, mas sem ilusões que os bancos vão ganhar menos, que a concentração de terra vai diminuir e que a Reforma Agrária vai ser feita, etc, etc. Isso é, para não cairmos no campismo (doença infantil da esquerda) o voto na Dilma é um voto tático diante da barbárie serrista.



Muito do que o petismo está falando agora é pura retórica e deve ser descartado: “oh, você não está vendo como a Dilma está sendo atacada pela mídia?”. Pena! Foram OITO anos sem a criação de nenhuma mídia alternativa de longo alcance. Além disso, o petismo realmente acreditou que ao ser democrático a direita raivosa iria agora “respeitar” os princípios de governabilidade? Quanta ingenuidade! O pensamento conservador agora está se repolitizando pelo espaço aberto da despolitização que o petismo instaurou.



Outra balela petista que escuto sempre é que com num eventual governo Dilma os movimentos terão mais espaço para lutar. Bem, não necessariamente. Peguemos um exemplo claro que é sua relação com o MST.



Dilma é anti-MST na essência. Sabemos que a o método da luta pela terra no Brasil tem como centralidade as ocupações de terra. Sem elas não existe reforma agrária. Paremos de brincadeira. Dilma disse o seguinte numa recente entrevista: “E não condeno (as invasões) de hoje não. Condeno desde o início do governo Lula. Ele condenou também explicitamente. Nós não concordamos com invasão de prédio, invasão de terra. Não achamos que esse é o método correto”. E daí que “nós não achamos que esse é o método correto”? O que Dilma sabe sobre a práxis da luta de classes no campo? Ela não sabe nem a diferença de uma invasão e de uma ocupação e quer pautar o movimento sem-terra a partir de uma “ligações políticas históricas” entre PT e MST? Dilma que não é uma liderança popular quer impor ao movimento os métodos que podem e devem ser usados? A partir de qual parâmetro? Dilma recentemente abriu o jogo: “fizemos uma política que tirou as principais bandeiras deles. Não foi porque a gente reprimiu. Tem coisa mais eficaz que atender o movimento?”. Em outras palavras, quando o Estado compra o movimento estaria existindo um avanço para a esquerda, ou seja lá o que ela quer dizer com “esquerda”. É a Terceira Internacional correndo nas veias de Dilma. Contra o reacionarismo de Dilma que disse que “Nós não somos o MST”, o real desafio é o lema do MST ser levado a cabo pelo MST e pelo que resta da esquerda: “Todos somos sem-terra”. Como escreveu meu amigo Rodrigo Choinski





"Neste contexto, posição vergonhosa assume a maioria dos movimentos sociais. Mostrando que o medo é um mau conselheiro, a maioria assume a posição equivocadíssima de apoio total e irrestrito (até apaixonado) a Dilma e por consequência apoio (sem concessões) à continuação da atual ordem sócio-econômica e, portanto de tudo aquilo que pretendem combater – já que os problemas que enfrentam têm justamente causa no sistema do capital [...]. É justamente a falsidade do projeto petista – colocado hipocritamente como dos trabalhadores – que mantém ativa a possibilidade da direita mais ordinária voltar ao poder, o que cedo ou tarde vai acontecer, (resultado das instabilidades econômicas do capitalismo que afetam o quadro político, como a possível nova onda da crise mundial pronta para arrebentar no Brasil no biênio 2011-2012)".



O “fim da história” se estabilizou com Lula que, como ninguém em toda a história, geriu uma pós-política em conjunto com as classes industriais, financeiras e latifundiárias. Do ponto de vista do capital, Lula é “o cara”. Agora vem a coroa (DILMA) demonstrando, cada vez mais, que a “linha de menor resistência” faz parte do problema da esquerda, e não da solução. Viva a ambigüidade centrista de DILMA. É DILMA sem ilusões porque não há alternativa – situação criada pelo próprio PT.



Como dizia Marx, a vergonha já é uma revolução. Nada mais necessário hoje do que sentir vergonha do que o PT se tornou para reavaliar as alternativas que estão sendo construídas e não seguir eternamente o caminho mais fácil, mas cheio de oportunismo em nome da “governabilidade”. É o “fim da história” na ascensão do bipartidarismo – PT e PSDB – que esconde sua falsa oposição já que nenhum dos dois postula uma real alternativa que coloque em jogo o marasmo político existente: tudo em nome da gestão pós-política do Estado capitalista do século XXI.

3 comentários:

Unknown disse...

Resposta de Walter L. Mauch

Ficar gritando que o PT não é mais aquele, que assumiu uma política centrista é chover no molhado. Estes esquerdistas do PSOL sofrem do problema crônico de não ter nenhuma relação real como a luta de classes. Vivem do esquerdismo de gabinete, super-radicais nas suas posições teóricas, mas sem a mínima noção da real correlação de forças na sociedade.
Alguém realmente acredita que as minguadas forças progressistas no Brasil conseguiriam realizar um governo de esquerda??? Só delirantes e sonhadores.
O quê está aí pode melhorar muito, mas não tenhamos ilusões, superar o capitalismo requer muito mais do que apenas gritar que o PT é traidor.
O papel do PT é realizar trabalho sujo que a burguesia nunca teve coragem de fazer, levar o Brasil para o capitalismo não dependente. Se conseguir já será uma grande vitória. Achar que nós temos ilusões com a Dilma é desconhecer que nos anos 80 éramos convidados a sair do PT por mantermos coerência com o ideário socialista.

Anônimo disse...

Brilhante seu texto companhero F Marcelino
abraço
André Melao

Fernando Marcellino disse...

Walter, menas.

Não te conheço. Quem é você para falar em relação real com a luta de classes? Isso mesmo, o Brasil vai deixar de um país dependente com a democracia representativa. Não aceito que o PT seja traidor. Fez o limite de sua organização e sob o máximo de pragamatismo. O que será que a economia dependente vai ser superada com Henrique Meirelles no comando do poder do capital brasileiro? Menas Walter, menas.