segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Estratégias Imperialistas Contemporâneas: ciberguerra e empresas militares privadas

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As questões relativas à “segurança” tomam uma dimensão cada vez mais central na resolução dos conflitos nacionais e internacionais em nossos dias. Desde o início do contexto pós-Guerra Fria, no final dos anos 1980, a noção de “segurança” tomou uma proporção cada vez maior ao englobar uma enorme diversidade de processos além da clássica preocupação com a soberania das nações: segurança energética, segurança migratória, segurança urbana, segurança alimentar, biossegurança, segurança humanitária, ciber-segurança, segurança ecológica, segurança das propriedades intelectuais e genéticas, segurança privada etc. É possível dizer que uma das principais marcas deste período é uma generalizada securitização desigual do sistema mundial da dimensão mais micro (biogenética e cibernética) a macro (órgãos de defesa e segurança internacional, atividades extra-militares em diversos países, satélites de segurança).

Enquanto que, grosso modo, no período da Guerra Fria cada Estado – dentro de cada bloco respectivo – tinha sua soberania subsumida pela potência militar e econômica a que se vinculava, Estados Unidos ou União Soviética, com o fim desse período ocorre uma desarticulação das tensões internacionais em torno desta dualidade e os Estados Unidos aparecem como a única superpotência militar mundial capaz de derrotar qualquer “ameaça a segurança internacional”.

Assim, o contexto pós-Guerra Fria emerge com os Estados Unidos detendo a maior capacidade militar regular da história da humanidade, ao mesmo tempo que passa a perder progressivamente a legitimidade sócio-econômica para o uso irrestrito da violência diante da queda dos “inimigos vermelhos”, sinalizando o início de uma fase de crise e transição na luta pelo estabelecimento de uma nova ordem mundial.

É este vácuo criado na arquitetura da segurança mundial pós-Guerra Fria que impulsiona, em especial pelos Estados Unidos, o processo de privatização e internacionalização das forças militares (a criação das Empresas Militares Privadas - EMP) em conjunto com a transformação das guerras de dimensão global em conflitos de baixa intensidade e reduzida expressão estratégica.

Estas empresas passam a cumprir um papel fundamental na estratégia norte-americana de “salvar-se da crise hegemônica” com a ampliação do novo paradigma de segurança que agora já inclui a possibilidade de intervenção militar global utilizando agentes de segurança privada. Podem-se encontrar serviços destas empresas militares em diversos pontos, como assistência humanitária, nas guerras, operações de reconstrução nacional, guarda, movimentação financeira, serviços de alarme, segurança eletrônica, aérea, proteção executiva, diplomática, de bens, plantas industriais, embaixadas, centros de organizações internacionais e instalações de empresas multinacionais, construção de presídios, transporte, policiamento, logística e serviços de inteligência, treinamento de tropas e, em algumas ocasiões, no combate de fato – como no caso do Iraque e da Colômbia.

Seus clientes são Estados, ONGs, empresas multinacionais, organizações internacionais, executivos, jornalistas, políticos, entre outros, que estimulam um crescimento acelerado da demanda para este tipo de “serviço” no mercado internacional de segurança privada. Com estas empresas militares tomando a cena da “resolução de conflitos”, o Estado terceiriza sua soberania, perdendo a responsabilidade sobre os indivíduos que atuam por tais empresas e criando situações normativamente insustentáveis.

Os chamados “Neomercenários”, sujeitos empregados pelas Empresas Militares Privadas, se encontram numa zona de indiferença jurídica, sendo inimputáveis segundo qualquer padrão normativo internacional. Essa situação precipita situações de impunidade dando poder a agentes militares privados de decidir qual vida pode ser morta sem que se cometa homicídio, além de tantas outras infrações aos direitos humanos mais básicos.

Funcionários das EMPs não se encaixam na categoria de soldados regulares e assim não podem ser punidos pelos códigos militares tradicionais. Como também não existem diretrizes que orientem a direção, gestão, controle e punição das companhias e seus empregados, esta situação generaliza a insegurança nos territórios e recria a natureza bélica dos novos conflitos e lutas extra-parlamentares.

Além deste processo de privatização das formas de segurança, encontramos outra tendência decisiva sobre a reorganização do imperialismo: a ciberguerra. Como ficou claro na recente “Nova Estratégia Internacional para o Ciberespaço” encabeçada pelos Estados Unidos de Obama, a partir de agora serão usados “todos os meios necessários – diplomáticos, informativos, militares e econômicos – que sejam apropriados e consistentes com a legislação internacional” contra aqueles que ameaçarem o ciberespaço global com “atos agressivos”. Conforme o documento, “certos atos hostis conduzidos no ciberespaço podem obrigar a tomada de ações pelos compromissos que temos com nossos sócios de tratados militares. Quando seja justificado, os Estados Unidos responderão aos atos hostis no ciberespaço como responderíamos a qualquer outra ameaça a nosso país”.

Assim, os Estados Unidos não se limitam a garantir a segurança de seu próprio território, mas de todo o ciberespaço global diante das ameaças dos “terroristas cibernéticos” que podem se encontrar em qualquer lugar do mundo. Com isso, “os Estados Unidos assegurarão que os riscos associados a atacar e explorar nossas redes pesem mais que os potenciais benefícios”.

O Pentágono considera a partir de agora que qualquer “ciberataque” de outro país pode ser considerado um ato de guerra, uma agressão virtual que pode desencadear um ataque militar “tradicional”. Não seria esta estratégia uma espécie de “doutrina Bush no ciberespaço”? Esta não seria a tentativa do governo Obama de dar um passo a mais no controle progressivo da rede, uma espécie de militarização da segurança global sobre a propriedade intelectual e a organização coletiva? Estamos presenciando uma espécie de Imperialismo Virtual, etapa superior do capitalismo global.

Nesta doutrina estratégica, aparece como necessidade imperial a dominação defensiva e ofensiva do espectro completo do mundo – espaço, mar, terra, ar e ciberespaço. Em maio de 2010 o Pentágono estabeleceu seu novo Ciber Comando dos Estados Unidos, que completa seus outros comandos. Até agora os Estados Unidos têm resistindo a todas as tentativas de estabelecer tratados internacionais sobre a ciberguerra. Mesmo assim, tem sido declarado publicamente que qualquer ataque cibernético a sua infra-estrutura será considerado um ato de guerra e provocará represália física.

Já houve propostas em setores de defesa dos Estados Unidos de criação de empresas militares privadas para lidar com o “ciberterrorismo”. Esta seria a mescla das duas tendências do imperialismo contemporâneo e que parece aprofundar a capacidade de dominação militar e social em ampla escala. Estamos entrando numa nova era do imperialismo, com novas guerras – privadas e cibernéticas. Por mais que sejam novas, continuam sendo guerras, só que agora com um caráter muito mais nebuloso sobre suas intenções e objetivos, pois é muito mais difícil definir o que é um ataque de guerra e como se lutará.

Encontramo-nos no limiar de transformações radicais no exercício da violência que passa a se desdobrar em novos poros, cada vez mais privados e imateriais, com novos inimigos imaginários e reais. É muito provável que o próximo período será marcado por tentativas cada vez mais escabrosas de censura virtual em larga escala e controle social por segurança privada. Mas o que fazer quando os agentes e os espaços de luta se transformam? Novos desafios surgem.

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