sexta-feira, 28 de novembro de 2008

O que resta da modernidade?

Voltando para casa hoje tirei algumas conclusões provisórias e instáveis. Hoje não temos o “mapeamento cognitivo" suficiente para lidar com nossos mandados simbólicos sobrecarregados da modernidade (a pós-modernidade seria, nesse sentido, uma resposta severa a essa incapacidade). As mudanças nos últimos anos, principalmente em relação a tecnicização da ciência e a precarização dos laços humanos, trouxe como resposta do sujeito uma incapacidade de lidar com a Verdade. Aqui Verdade não usava em qualquer tipo de contexto bíblico, mas sim o entendimento sobre o norteamento das coordenadas rumo à emancipação humana para além do capital hoje, se ainda pensamos nisso, é claro.
Em tempos sombrios de crise estrutural do metabolismo global temos que ter em mente alguns pontos cruciais:
1) O processo de hibridização entre capital e Estado (não seria esse o significado real da democracia-liberal de hoje? Enquanto nos EUA demoraram em torno de semana para “votarem” o plano de “salvamento” do sistema financeiro, na China, normalmente denominada uma ditadura foram necessárias algumas horas para que um plano de salvamento também fosse posto em prática) que envolve necessariamente uma maior violência social para reprimir os grupos que lutam contra a lógica de maximização de lucros a custa da classe-que-vive-do-trabalho. Em outras palavras, a necessária força do Estado para conter as contradições reais que se acirram no plano de reprodução ampliada do capital. Se o nazismo é impossível hoje, qual será a nova forma de legitimação para um processo praticamente transparente de maciça transferência de renda?
2) Considerando que o estado de exceção torna-se potencialmente a regra, qual será o fardo histórico para os movimentos emancipatórios que buscam a superação radical nesse metabolismo social que não tem limite para responder adequadamente a seus imperativos existenciais de acumulação e expansão constante e progressiva? Aqui parece que a ofensiva socialista torna-se um novo imperativo contra a posição par excellence defensiva em relação à superação radical do Real do Capital: a luta de classes.
3) Aprofundando ainda mais essa Idéia, em termos lacanianos, o que poderíamos pensar em relação à superação radical do Capital e seu antagonismo constituinte com uma necessidade estrutural do sujeito de superar o Real como dimensão incognisível de estruturação da realidade? Essa tese provavelmente não teria muitos adeptos pela contradição entre estrutura do sujeito (da modernidade) e sua superação radical, entretanto, com o desenvolvimento atual das tecno-ciências, quais poderiam ser os limites? Testes hoje já constatam a possibilidade de transformar o cérebro humano em um desejo instantâneo como um controle remoto se esvaindo a diferente entre desejo e realidade. Quais seriam os limites desse processo? A luta iluminista ainda não pode ser deixada de lado. Entretanto, a pergunta que fica é: essa mudança cognitiva não pode ser feita naturalmente? Minha posição é positiva aqui: se os limites do Ser são aqueles da ordem simbólica, da linguagem, do Outro, não estaria aqui a resposta para esse novo mapeamento cognitivo? Talvez.
4) Sobre o amor: considerando o atual processo de desenvolvimento das forças produtivas, a virtualidade no sentido deleuziano de fluxo livre de devires não mostra que a materialidade das relações é apenas um pressuposto ontológico das relações humanas? Apenas porque aqui se abre uma porta nova da interação humana a ser investida: a rede imaterial. Não de computadores (não poderia dar uma opinião muito firme em relação a isso, pois confesso que meu entendimento sobre o computador ainda é praticamente nulo), mas sim de trocas simbólicas que percorrem necessariamente da construção de alternativas a desestruturação radical do sujeito moderno. Se o velho torna-se cada vez mais velho e o novo não consegue desenvolver-se ainda, não poderia ser essa uma resposta plausível para um novo projeto coletivo de emancipação hoje?