quinta-feira, 2 de maio de 2013

Porque o sectarismo é um oportunismo?





        


         A partir de uma visão principista sobre a realidade histórico-social e da avaliação voluntarista sobre a “gestação iminente de uma crise revolucionária” no planeta, tem-se exacerbado o sectarismo entre as esquerdas. Tudo é feito para demarcar posições. Na sua leitura simplista, toda fraqueza do movimento socialista é culpa da “traição das direções”, dos reformistas e centristas. Sua presunção doentia superestima a atual correlação de forças no país. Afinal, porque estas correntes não explicam porque as entidades que dirigem ainda não começaram uma ofensiva dos trabalhadores para servir de exemplo de combatividade e representatividade?

Essa parte da esquerda costuma ser cercada de inimigos por todos os lados, julga que a história resulta de sua vontade, enche a boca de categorias teóricas e procura não misturar-se com pobretariado. Acham que podem chegar a qualquer momento e propor soluções próprias para momentos de grande tensão, acreditando que as massas os seguirão, dependendo apenas de capacidade de convencimento. Recusam-se a partir do nível real de aprendizado delas participando do processo real, às vezes lento, de luta e descoberta de problemas e soluções. 

Para eles, tudo depende dos setores mais avançados, dos líderes, partidos e governos "ajudarem" os setores mais atrasados a avançarem, interferindo em seu nível de conscientização, organização e luta. E, quando líderes, partidos ou governos não agem sobre as massas como pretendem, isso representa uma traição. Ficam mais ligados nas disputas entre as cúpulas e desprezam o trabalho de criar raízes fortes com as camadas populares, através de organizações de base capazes de acompanhar e participar do dia-a-dia de luta daquelas camadas. Desconsideram que só o povo pobre e trabalhador, massivamente mobilizado, faz revoluções, independentemente de haver ou não partidos revolucionários em seu seio. E esse povo só se joga no movimento da revolução quando não pretende mais viver como até então e sente a coragem que não tem mais nada a perder. Estes sinais só conseguem ser percebidos por quem está entranhado na vida do dia a dia do povo.

Este sectarismo na verdade é uma forma de oportunismo, pois preferem abandonar a luta concreta para ganhar as massas usando como pretexto as “burocracias” que impedem sua “ação revolucionária”. Esta conduta política revela um desejo de ganhar as massas com manobras organizativas – e aqui os exemplos são incontáveis. É o desespero do tudo ou nada. Não percebem que o auto-isolamento das massas equivale a uma traição à revolução.

Na verdade procuram dentro de seu grupismo “heroico” a satisfação de todos os dias e a oportunidade de reconhecimento público. O que vale é o glamour do “auto-reconhecimento” como lutadores sociais, mesmo sem discernimento da luta de classes e da necessidade de fortalecer atitudes e posições científico-políticas, para uma longa e difícil batalha de formação de lideranças conscientes e militâncias esclarecidas. 

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Perspectivas para o Brasil em 2013: sobre o crescimento econômico




Como disse a presidenta Dilma Rousseff sobre os desafios de 2013 num recente balaço dos 10 anos do governo federal dirigido pelo PT:

"O desafio que se impõe para os próximos anos é, simultaneamente, acabar com a miséria extrema e ampliar a competitividade da nossa economia. O meu governo tem enfrentado estas duas questões. Temos um compromisso inadiável com a redução da desigualdade social, nossa mancha histórica. Ao longo de 2012, lançamos planos de concessões de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos, que abrem as condições para um novo ciclo virtuoso de investimento produtivo. Reduzimos a carga tributária, ampliamos as desonerações na folha de pagamento e, em 2013, iremos baratear a tarifa de energia. São medidas fundamentais para aumentar a competitividade das empresas brasileiras e gerar as condições de um crescimento sustentável".

Sem dúvida, um dos maiores desafios do Governo Dilma em 2013 é conter a desaceleração da economia, pôr em prática o pacote de melhorias na infra-estrutura e logística, ampliar o alcance dos programas sociais para tirar cerca de 6 milhões de brasileiros da extrema pobreza, elevar rapidamente a taxa de investimento, reduzir mais intensamente a taxa de juros, utilizar o câmbio como indutor de industrialização, aumentar a oferta de alimentos da agricultura familiar e a concorrência nos setores monopolizados ou oligopolizados, melhorar a qualificação das forças de trabalho e manter a situação de “pleno emprego” existente no país, criar novas empresas estatais estratégicas e fazer funcionar realmente as empresas estatais recentemente criadas. Tudo isso com ventos desfavoráveis vindo de fora, dificultando a previsão sobre o futuro.  

Dilma disse que espera um "pibão grandão" para 2013, resultado de um amadurecimento de todos os frutos de 2012. Mas como irá realizar isso? Que medidas são necessárias para assegurar a reativação do crescimento? Quais são os problemas reais que travam o crescimento brasileiro? Que arsenal de estímulos para induzir e controlar o nível de crescimento o governo deve executar?

Existem vários caminhos para retomar o crescimento em 2013. É provável que já seja um consenso que o crescimento pela ampliação das exportações seria um caminho mais arriscado, pois esbarra num mercado externo saturado e fortemente vendedor. A não ser em algumas commodities, na agricultura e pecuária é possível algum resultado, mas mesmo assim sem expansão significativa sobre 2012. Portanto, é preciso articular a retomada do crescimento considerando que, por hora, nada indica que a crise que assola o centro do capitalismo irá ser superada. É provável que a crise na Europa irá reduzir o ritmo de crescimento das exportações e redução dos preços internacionais dos preços internacionais, podendo piorar a situação na balança comercial do País, contribuindo para a redução do crescimento. Por hora apenas a China e alguns outros países apresentam um dinamismo considerável.

Os dois caminhos mais promissores para aumentar o crescimento do País é elevar os investimentos e ampliar do consumo. Alguns dizem que o governo deve priorizar o investimento como principal indutor do crescimento, abandonar a indução via consumo pelo suposto “endividamento excessivo” das famílias, ignorando que cerca da metade da dívida é com juros. A insuficiência dos investimentos seria a causa da paralisia econômica. A solução seria o governo investir mais, mas desconsideram que os investimentos levam tempo para maturar e que, por meio de concessões e parcerias, o governo costuma gastar muito mais que as previsões originais de recursos e prazos além da precária fiscalização sobre a execução dos investimentos. Talvez seja por isso que outros dizem que o governo deve priorizar a ampliação do consumo e que a política de investimentos é muito demorada e sem eficácia real sobre o crescimento. A nosso ver, a solução para o crescimento não pode ser investimento ou consumo, mas a combinação de ambos. Estes são os motores do crescimento e, junto com a remoção do conjunto de freios ao crescimento, devem ser o foco de 2013. É certo que o grande desafio é propiciar as condições necessárias para o crescimento concomitante do consumo e do investimento, assim como manejar os instrumentos necessários para que essa expansão da demanda não provoque efeitos colaterais indesejados, como aceleração da inflação, aumento do déficit externo ou das cargas tributárias.

É claro que ativar o investimento num quadro de elevada incerteza global é um desafio difícil. Mesmo assim, é provável que a maior expectativa de 2013 é a retomada do investimento privado. Conforme o governo, as medidas de 2012 teriam trazido, no seu conjunto, importantes incentivos para investir, como as desonerações da folha de pagamentos, reduções de tarifa, queda de juros e melhoria no cambio. O governo federal projeta que estes incentivos estimulem principalmente vários setores da indústria de transformações, mais afetados pela estagnação. Estas mudanças credenciam o País para um aumento no crescimento econômico maior que 2011-2012. Em breve o governo também deve anunciar um programa de financiamento à inovação em setores estratégicos e mudanças na legislação para facilitar a importação de mão de obra qualificada.

Mas estas políticas de crescimento necessitam se transformar em política de desenvolvimento industrial, científico e tecnológico junto com políticas de apoio à existência de formas econômicas capitalistas, micro e pequenas empresas, além do reforço da propriedade estatal, pública e solidária. Além da concentração dos investimentos estatais em áreas estratégicas e elevação da taxa nacional de investimentos para 25% a 30% do PIB, levando em conta a instalação de plantas de fabricação dos setores produtivos estratégicos, talvez o maior desafio para 2013 seja a definição de uma política de investimentos estrangeiros capaz de direcionar tais investimentos para o adensamento das cadeias produtivas e para o fortalecimento das empresas estatais, privadas e públicas de capital nacional. A política de investimentos, para ter como meta uma redução real da dependência de máquinas e equipamentos de última geração, precisará contemplar com prioridade o adensamento das cadeias de produção de máquinas ferramentas e de equipamentos, que incorporem os avanços tecnológicos em novos materiais, geradores, eletrônica, automatismo e nanotecnologia bem como superar os gargalos na construção energética e infra-estrutura. É provável que isso só possa ser feito se o governo tenha um órgão responsável por examinar se os investimentos correspondem ao interesse nacional. Outro ponto crucial para alavancar o crescimento em 2013 é o bom funcionamento das empresas estatais existentes, bem como a criação de novas, como uma empresa estatal que possa extrair e industrializar terras raras para produzir novos materiais. Não adianta cobrar competitividade se nem as estatais são competitivas e lucrativas.

As perspectivas para 2013 vão depender da política que o governo adotar. Caso não mude o que vem fazendo o pífio crescimento de 1% previsto para este ano se concretizará. É preciso tirar o pé do freio, aumentar o investimento, reduzir drasticamente os juros, cuidar da inflação com incentivos a agricultura familiar, orientar os investimentos estrangeiros e fazer as estatais funcionarem. Sem isso o futuro já parece sombrio. Vamos ver. 

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Ainda sobre o “Modo PSOL de Governar”: de Macapá à Itaocara



         Afirmamos que o “modo PSOL de governar” em Macapá e Itaocara deve, por um lado, se focar em colocar o povo na ofensiva, organizá-lo para resolver diretamente os seus problemas com o auxílio do aparelho estatal para fazer avançar a consciência popular e defender o governo diante dos boicotes da burguesia. Por outro lado, junto com a liquidação das dívidas das gestões anteriores, é preciso realizar medidas de emergência que corrijam as violentas contradições sociais, reorientando os orçamentos públicos no sentido de dar alimentação, saúde, habitação, energia elétrica, escola, emprego e transporte à população bem como delinear um caminho de desenvolvimento que não seja exclusivamente capitalista. Um dos problemas deste “modo PSOL de governar” é a dificuldade em determinar políticas com diretrizes claras, metas e medidas concretas nestes dois âmbitos.

Para construirmos o “modo PSOL de governar” é necessário concentrar esforços para forjar um modelo original, sintonizado às especificidades locais. Temos a obrigação de transformar positivamente as duas cidades que vencemos e é por isso que  vejo que governar estas cidades poderá ter um poderoso efeito na construção de um projeto alternativo para o país.

Antes de tudo, os governos municipais do PSOL devem levar em conta que foram eleitos para resolver os problemas específicos, por mais que a preocupação generalizada dos eleitores esteve voltada para as questões que poderíamos chamar de desenvolvimento econômico e urbano: infraestrutura de transportes, moradia, saúde, educação, saneamento, emprego, condições ambientais, esporte e lazer, não necessariamente nessa ordem. O povo esta preocupado com a melhora de seu padrão de vida, no nível de seu bem-estar. Neste contexto, a idealização do socialismo não é suficiente para induzir a base social a dar sustentação ao governo. É preciso melhorar a vida do povo concretamente junto à luta ideológica permanente. O “modo PSOL de governar”, portanto, não deve vacilar em construir as bases de um poder alternativo que combine as ações do governo com iniciativas populares.

Em primeiro lugar, o “modo PSOL de governar” deve colocar em xeque o regime representativo clássico com vários instrumentos como Orçamento Participativo, conselhos municipais, congressos da cidade, fóruns regionais e setoriais, juntais locais, etc. Mais concretamente, trata-se de conceber um governo local forte capaz de se impor sobre os grupos dominantes locais (poder econômico, elites locais) e combater as práticas fisiológicas e patrimonialistas, sobretudo por meio da criação e do fortalecimento das esferas públicas democráticas em nível local (ou seja, implantando um modelo de gestão pública em que se partilha o poder com a sociedade civil). A inserção da população no processo decisório das políticas públicas e a sintonia com os movimentos sociais não pode ser negociável no “modo PSOL de governar”. Mas o governo não deve ficar restrito à participação dos movimentos organizados. Somente uma gestão local comprometida com a participação popular ampla pode contribuir para o florescimento de uma cultura política socialista, alternativa à cultura política dos dominantes, capaz de reeducar o povo para que ele saiba que pode lutar pelas próprias mãos, incentivando a democracia direta nas decisões - como foi o caso da assembleia que aprovou os nomes dos secretários da educação e saúde em Itaocara -, incentivando a organização nos sindicatos, movimentos populares etc. Precisamos fortalecer uma base social que lute em defesa do “modo PSOL de governar”.

Neste processo de democratização do governo municipal é importante lembrar a importância do trabalho de modernização administrativa com transformações no modo de prestar os serviços públicos. Um ponto nesta modernização deve ser a ampliação das novas tecnologias de informação para amplos setores da população. Ao terem acesso a números, aos dados e informações do orçamento público, a população terá maior capacidade de fiscalização e politização. Mesmo tendo em conta as limitações de acesso à Internet pelos cidadãos, imagine-se o salto de qualidade nos serviços e em seu controle público quando uma pessoa passa a ter condições de acompanhar, diretamente, o caminho interno de um processo de seu interesse (algo que, até então, é uma das caixas-pretas da administração estatal). Alguém poderia falar que isso é apenas um detalhe, mas para cidades como Amapá e Itaocara esta modernização administrativa é decisiva. As medidas para aumentar a participação popular devem ser acompanhadas pela modernização do exercício do poder executivo.

Além de luta política para conseguir exercer o governo, também é preciso planejar a execução de programas emergenciais, avaliando se existem surtos de determinadas doenças (como a Malária em Macapá), falta de moradia digna, calçadas adequadas, pavimentação, coleta de lixo, esgoto, água, energia elétrica, linhas de transmissão, iluminação pública, capacitação da força de trabalho, modernização administrativa da prefeitura e superação dos gargalos na saúde e no transporte público.

A complexa execução destes programas emergenciais deve ser acompanhada, na medida do possível, com políticas que avancem na socialização da riqueza das cidades. O “modo PSOL de governar” deve misturar um programa emergencial com a elaboração e execução de projetos estruturantes, atuando em várias frentes. Poderia citar algumas medidas importantes, seja em Macapá ou Itaocara, como a ampla valorização do servidor municipal, regulamentação de instrumentos como IPTU progressivo no tempo e usucapião, identificação e cadastramento de vazios urbanos existentes para induzir ao uso produtivo e coletivo destas áreas, revitalização de parques, inclusive com a criação de centros de leitura e estudo, obras que deem acessibilidade a pessoas com deficiência, idosos, gestantes, etc, construção de ciclovias e diversificação de modais, gestão ambiental integrada, uma política de arborização de vias urbanas e de construção de espaços públicos arborizados para usufruto e lazer da população, políticas de coleta seletiva de lixo, estímulos a atividades culturais e esportivas populares, incentivo a instalação de indústrias, serviços e atividades agropecuárias. Seriam muitas frentes para impulsionar o bem-estar da população e criar um poder local alternativo.

         Tanto em Macapá como em Itaocara existe um grande peso da produção rural, apesar de sua população morar predominantemente na área urbana. Em Itaocara existe uma forte produção pecuária, de legumes e derivados do leite enquanto Macapá possui uma imensa e diversificada produção agropecuária e extrativista, distribuída pelos Distritos como Fazendinha, região dos rios Pacuí e Pedreira, Curiaú, Bailique, Coração, Carapanatuba, dentre outros. Em ambas as cidades é preciso criar políticas específicas para a área rural com a elaboração e implantação de um conjunto de ações concatenadas junto aos trabalhadores rurais assentados. Uma intervenção responsável pode gerar assentados que combinam atividades agropecuárias com outras não agrícolas (turismo ecológico, lazer, serviços, bens de saúde, etc). Neste programa devem ser garantidas assistência técnica e investimentos na produção, apoio ao desenvolvimento de produtos locais e regionais de qualidade, apoio à participação em feiras, contatos com redes de comercialização (nacional e internacional), diversificação dos sistemas produtivos e apoio à industrialização dos assentamentos.

Do ponto de vista do turismo, Itaocara fica na região do Rio mais precária, muito diferente do alto potencial turístico do litoral, como a região dos Lagos e Angra. Já em Macapá existe a oportunidade de consolidar cadeias turísticas, lembrando seus diversos pontos reconhecidos em nível nacional e mundial, como a “esquina do Rio Amazonas com a Linha do Equador” ou a Fortaleza São José de Macapá. Dessa forma, em Macapá existem diversas possibilidades para estruturar e promover o desenvolvimento do turismo para viabilizar emprego e renda. Uma possível ação em Macapá tanto para impulsionar o turismo como melhorar o bem-estar da população seria a criação do transporte hidroviário da orla do Bairro Cidade Nova ao Distrito de Fazendinha, bem como em pontos chave da cidade, como Perpétuo Socorro, Canal do Jandiá, Canal das Pedrinhas, Igarapé da Fortaleza, Aturiá e Santa Inês, proporcionando aos usuários transporte público rápido, agradável, confortável e barato. É uma realização ousada, mas que poderá dar um salto da organização espacial da cidade e ajudar o promover a cidade ao roteiro nacional e internacional do turismo.

O “modo PSOL de governar” deve incluir também as atividades de Economia Solidária como importante fonte de trabalho e renda, além de estímulo à economia local. As prefeituras deveriam considerar a criação de uma Feira Solidária Itinerante voltada à comercialização dos produtos da economia solidária, atendendo ao transporte das mercadorias e infra-estrutura básica dos espaços. A prefeitura também poderia se estudar também a possibilidade de aquisição de parte das compras para a merenda escolar e programas de abastecimento e feiras em propriedades familiares e de produção orgânica, como forma de manter as cooperativas com renda e qualidade de vida. Outro componente destas atividades de Economia Solidária seria a criação de um Banco Solidário do Povo voltado a atender com linhas de microcrédito pequenos empreendimentos, em especial de economia solidária, para aquisição de maquinaria, capital de giro e investimento. O Banco Solidário do Povo poderia ter linhas de microcrédito voltadas à produção, comércio ou serviço cedidos para quem não pode acessar as fontes de financiamentos “oficiais” por causa da burocracia, exigências quanto ao fiador, nível de renda, patrimônio e outras normas bancárias.

Em suma, estas ideias estão relacionadas com o planejamento socialista das cidades. É preciso pagar as dívidas deixadas, fazer auditorias de contratos, verificar a folha de pagamento, modernizar a administração e desmontar máfias que atuam nas prefeituras. Junto com isso o governo deve garantir a mobilização popular para encaminhar a melhora nas condições de vida do povo com um programa emergencial, do atendimento de saúde nas unidades básicas, garantindo médicos  e remédios até a limpeza da cidade, o transporte público, os problemas da falta de moradia digna, etc. Estas medidas devem abrir caminho para uma linha de desenvolvimento que inclua a produção e socialização de riqueza da cidade. Todas estas medidas se encontram com um problema, ainda a resolver: a implementação da agenda com projetos estruturantes exige razoável espaço para novos investimentos inclusive os voltados à prestação de novos serviços, que num segundo momento se transformam em gastos de custeio. A expansão da prestação de serviços públicos (sobretudo inspirada na inversão de prioridades) implica, quase sempre, aumento do número de servidores. Dados os outros dois fatores, uma ampliação contínua de serviços públicos tende a levar ao esgotamento da capacidade de investimento futura, ou seja, ao colapso da agenda com projetos estruturantes. Daí a necessidade de um cuidadoso planejamento. Conseguindo lidar com este desafio conseguiremos mostrar, desde o nível local, a possibilidade do uso do fundo público para a maioria da população e, na linha da ampliação dos direitos, instaurar uma nova relação entre a comunidade e o poder estatal, em que aquela possa controlar a este por meio da participação popular e abrir espaço para o questionamento da dominação. Significa, portanto, cumprir um papel de natureza não apenas conjuntural, mas estratégica, na linha da construção do socialismo.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Sobre o “Modo PSOL de Governar”



Depois de oito anos, o PSOL vai pela primeira vez ocupar cargos no Executivo. É evidente que temos dificuldades em relação a uma definição mais cabal sobre o significado e o caráter do “modo PSOL de governar”, afinal, é a partir de janeiro de 2013 que o PSOL dará início às suas primeiras experiências de governo frente às prefeituras de Macapá (AP) e Itaocara (RJ). É por isso que o debate sobre o significado do modo PSOL de governar é um debate estratégico para nós.

O que é um “bom governo” do PSOL? A burguesia permitirá que o PSOL governe nessas cidades? Caso assumamos o governo municipal, em que os governos executivos do PSOL devem se focar? O partido aplicará um programa “socialista”? Ou ainda, quais serão as diferenças entre um “bom governo” do PSOL e outro qualquer? Como estarão integrados os governos do PSOL na formação de uma base política sólida para um projeto estratégico socialista, que deve ser a tarefa central do nosso partido? Como ligar os esforços de um governo municipal à luta política estadual e nacional?

Não existe qualquer experiência histórica de controle público do patrimônio privado das cidades e apropriação dos excedentes econômicos para fins públicos que tenha sido efetivada sem uma revolução. Qualquer governo majoritariamente de esquerda numa cidade em que predomina o modo capitalista de produção e em que a revolução socialista não está na ordem do dia deve ter claro que um programa de governo não vai executar medidas e ações típicas de governos e Estados resultantes de revoluções. É provável que alguns participantes dessa parte da esquerda acreditem que a eleição de um governo de esquerda seja capaz de transformar uma vitória eleitoral numa revolução pacífica. Se acreditam nisso, provavelmente ficariam frustrados e encarariam os resultados de nosso governo como uma traição.

É claro que ganhar uma eleição municipal não é uma “revolução”. Entretanto, é possível que as tentativas de boicote ao governo possam incitar um grande processo de mobilização popular. É provável que um “modo PSOL de governar” só possa vingar criando espaços para acelerar a conscientização do povo acerca dos problemas políticos que inviabilizam o avanço do governo bem como o desenvolvimento de formas de produzir e socializar riqueza.

Em primeiro lugar, o “modo PSOL de governar” deve ser uma luta coletiva na qual o próprio governo assume, necessariamente, o caráter de instrumento político de construção do poder popular. Um governo do PSOL não pode abrir mão de, por dentro da estrutura do governo, possibilitar os mais amplos espaços para a participação do povo, para o debate democrático, para o controle popular do Estado, para a construção, pelo povo na luta, do poder popular. Em nossos governos devemos mostrar que ao ocupar espaços no aparelho de Estado temos de criar todos os mecanismos possíveis para o aprofundamento, para a radicalização democrática como condição imprescindível à garantia de governabilidade de nossos governos. Nesse sentido, a participação popular deve ser marca de um modo PSOL de governar, pois não haverá hegemonia política se apenas construirmos o partido e governarmos com controle social, se não impulsionarmos a sociedade para que ela se auto-organize e eleve seu padrão cultural, de informação e de renda. Temos de combinar construção partidária com governo, com dinâmica de auto-organização da sociedade e com reforma do poder político-institucional. O orçamento participativo é apenas uma parte, mas o foco deve ser em fazer uma verdadeira “revolução cultural”. Teremos de pôr o dedo no problema das câmaras municipais e do Poder Legislativo. Estimular com que o povo perca o medo de mandar nos políticos acompanhando suas votações e deliberações, até começar a discutir o controle da mídia, o poder econômico, o clientelismo, a compra de votos. Portanto, o objetivo do “modo PSOL de governar” é colocar o povo na ofensiva, organizá-lo para resolver diretamente os seus problemas com o auxílio do aparelho estatal.

Em segundo lugar, um governo do PSOL deve se focar em realizar medidas de emergência que corrijam as violentas contradições sociais, reorientando os orçamentos públicos no sentido de dar alimentação, saúde, habitação, escola, emprego e transporte à população. Com o desenvolver destas medidas e com as forças adquiridas deste processo, o governo deve iniciar uma política planejada visando o desenvolvimento do conjunto das forças produtivas, isolando os inimigos, criando conselhos populares, gerando empregos qualificados e construindo formas de propriedade estatal e coletiva. Um governo do PSOL não deve se furtar de desenvolver as forças produtivas, isto é, as ciências, tecnologias, cadeias industriais, infraestrutura de transportes, energia e comunicações e a capacidade educacional e técnica da força de trabalho, e quanto mais ampliar a presença da propriedade estatal e pública na sociedade para estruturar cadeias produtivas completas ou quase completas nas cidades.

         Estas medidas possibilitariam com que um governo dirigido pelo PSOL pudesse delinear um caminho de desenvolvimento que não seja exclusivamente capitalista – bem como as medidas emergenciais necessárias que melhores as condições de vida do povo. Fazendo parte de um governo executivo, o PSOL deveria se focar em avançar na criação de condições para a transformação social, eles terão de desenvolver, em termos políticos, a descentralização do poder político e, em termos econômicos, as formas de propriedade que trazem em germe a possibilidade de sua transformação em formas socialistas. O elo entre estas transformações é impulsionar uma “revolução cultural”, para fazer avançar a consciência popular e defender o governo diante dos boicotes da burguesia.

         Obviamente, não se trata de um experimento simples, mas pode ser um caminho de construção do socialismo instigado pelo PSOL no governo. É preciso ter coragem e serenidade para assumir a responsabilidade de produzir um “modo PSOL de governar”, pois não há mais tempo e nem motivo de ter medo de ser governo. 

domingo, 23 de dezembro de 2012

Revolução burguesa no Brasil, do século XIX ao XXI


Burguesia e Estado no desenvolvimento capitalista no Brasil

É claro que a expansão do capitalismo no Brasil não reproduziu a história da construção do capitalismo nos países centrais. Mas quais são as singularidades da burguesia e da revolução burguesa no Brasil em relação ao modelo "clássico"? Quais foram as condicionantes para estas especificidades?

Entender a revolução burguesa no Brasil é compreender as transformações histórico-sociais que levaram a desagregação do regime escravocrata-senhorial e da formação da sociedade de classes, onde não ocorreu um feudalismo muito menos burgos, tal como fora criado historicamente pelas nações europeias.

Com a progressiva introdução de novas relações de produção no século XIX, mesmo que ainda muito aparentadas às relações escravistas, se iniciou uma divisão na classe dos latifundiários. Essas novas relações, timidamente capitalistas, tem seus primeiros passos na agricultura sob a tutela de latifundiários. Com o corte na importação de escravos estas relações sofreram um impulso que, no caso da cafeicultura, beneficiou a acumulação de riquezas, grandes comerciantes exportadores e o próprio Estado. Isso permite que o latifúndio aplique parte dessa riqueza acumulada, por meio de bancos, em atividades industriais. Nas vilas ia crescendo uma burguesia comercial e de serviços, ambos com os pés na propriedade fundiária. Assim foram se abrindo as portas para que se aumentassem os investimentos de latifundiários e da burguesia comercial na formação de uma burguesia industrial, capaz de substituir produtos antes importados, como tecidos, ampliando também o incipiente proletariado.

De forma inusitada, a burguesia brasileira nasceu em meados do século XIX, dentro da sociedade escravista em decadência, num momento em que o capitalismo mundial preparava as condições para adentrar em sua fase monopolista. A burguesia brasileira não surge das entranhas de uma sociedade feudal inexistente, das camadas médias que se aglomeravam nos burgos medievais em função do comércio em luta contra os feudais como no caso europeu ou de pequeno-burgueses independentes como no caso norte-americano. A burguesia brasileira, por seu turno, não entra em confronto com a aristocracia agrária. Ela forma uma espécie de oposição dentro da ordem ajustando-se à tradição da mudança gradual baseada em acordos e compromissos com o monopólio fundiário e com a manutenção de ex-escravos nas divisas das grandes propriedades rurais.

Se no caso da França o atraso das relações de produção capitalista no campo levara à radicalização política da burguesia, no Brasil o latifúndio tem papel crucial no financiamento da burguesia comercial e industrial, tornando distante a hipótese da burguesia fazer alianças com os “de baixo” para por abaixo os entraves para seu desenvolvimento. A aliança latifúndio-burguesia buscou garantr que a expansão do capitalismo fosse feito sem democracia e sem envolver a ampla participação e organização das massas populares. Por aqui o avanço político da burguesia foi na base do “acórdão de elites”, talvez porque a burguesia brasileira se formou junto a tudo que existia de mais reacionário das velhas classes dominantes.

Não se trata tanto de discutir porque a burguesa brasileira foi incapaz de executar uma revolução democrático-burguesa no país, mas de saber como ocorreram as diversas formas de dominação burguesa que buscaram viabilizar a valorização do capital no Brasil. Em lugar de uma revolução burguesa capaz de superar os obstáculos pré-capitalistas, a burguesia brasileira seguiu a linha de menor resistência com as antigas classes dominantes, conquistando paulatinamente a completa dominação sobre a sociedade brasileira. Portanto, a dominação burguesa no Brasil está mais relacionada com os mecanismos de funcionamento do modo de produção escravista colonial do que a organização política independente, liberal ou ao menos republicana da burguesia brasileira. Seria mais correto, inclusive, caracterizar a burguesia brasileira como contra-revolucionária, com uma enorme desconfiança do povo, sempre pronta para combater as massas trabalhadoras nos processos políticos do país e com muita aversão às formas democráticas de governo. Essa burguesia não acreditava que o escravismo era um elemento anti-capitalista, para se ter uma noção da sua capacidade de naturalizar a desigualdade social e o autoritarismo. Gorender até defende que se dispensem categorias como revolução e contra-revolução para entender como a burguesia alcançou sua dominação, mas entendemos que é exatamente por meio desse processo que a “via brasileira” da revolução burguesa se manifesta.

A burguesia brasileira nasce não da luta contra as condições pré-capitalistas existentes, mas de sua cooptação econômica e política, através da dependência aos latifundiários, às burguesias mercantil e financeira, ao Estado e ao capital estrangeiro bem como seus traços ultraconservadores oriundos das antigas classes dominantes, inclusive com a adoção de formas autoritárias de Estado, peculiares àquelas classes. Em suma, no Brasil o avanço da dominação burguesa descartou uma revolução burguesa strito senso.

O papel político revolucionário que Marx viu na burguesia europeia acabou não vingando nos trópicos. Na Inglaterra e na França a conquista do poder político pela burguesia foi resultante de um confronto direito com a nobreza feudal. No Brasil o latifúndio foi se aburguesando, reforçou o processo de acumulação capitalista e ajuda a montar o aparelho de Estado para este fim. Por mais que a dominação burguesa no Brasil esteja cheia de aspectos revolucionários e contra-revolucionários, a própria burguesia como classe que disputa o poder político para implementar as melhores condições para a reprodução do capitalismo sofreu de uma espécie de auto-sabotagem. É possível afirmar que a burguesia brasileira tem uma origem servil, dividindo com a classe latifundiária dominante a perspectiva de viver sem assalariados criadores de mais-valia, sem força e nem esforços para transformar os escravos em força de trabalho livre para o capitalismo.

Em sua História da Burguesia Brasileira, Nelson Werneck Sodré (1967) tende igualmente a classificar a burguesia brasileira como uma classe débil, vacilante, que fugiu ao compromisso histórico de realizar no país a revolução democrática e antiimperialista. Diferentemente do “modelo clássico” em que a burguesia optara pela democracia, no Brasil a escolha se daria pelo autoritarismo. Na verdade, nascida do latifúndio, não é estranho que a burguesia brasileira tenha seguindo uma via conservadora de desenvolvimento. Por isso que um dos equívocos daqueles que desejavam uma “burguesia nacional” foi pensar que a essência ideológica da burguesia é liberal quando, na verdade, os valores políticos da burguesia revelam traços francamente autoritários e conservadores. A burguesia brasileira, portanto, é muito mais uma “burguesia interna” do que uma “burguesia nacional”, já que não se inclina ao confronto com os latifundiários e nem à formação de alianças com a classe trabalhadora. Ela prefere, antes de tudo, formar alianças com outros setores da classe dominante. Por mais ainda persistam tradições econômicas e sociais que sejam verdadeiros obstáculos a otimização dos investimentos e a reprodução do capital em grande escala, a burguesia brasileira preferiu ficar cega para uma visão mais ampliada dos interesses do capitalismo brasileiro. Conforme Chico de Oliveira,

Ao contrário da revolução burguesa "clássica", a mudança das classes proprietárias rurais pelas novas classes burguesas empresárias industriais não exigirá, no Brasil, uma ruptura total do sistema, não apenas por razões genéticas, mas por razões estruturais. Aqui, passa-se uma crise nas relações externas com o resto do sistema, enquanto no modelo "clássico" a crise é na totalidade da economia e da sociedade. No modelo europeu, a hegemonia das classes proprietárias rurais é total e paralisa qualquer desenvolvimento das forças produtivas, pelo fato mesmo de que as economias "clássicas" não entravam em nenhum sistema que lhes fornecesse os bens de capital que necessitavam para sua expansão: ou elas produziriam tais bens de capital ou não haveria expansão do capitalismo, enquanto sistema produtor de mercadorias. A ruptura tem que se dar, em todos os níveis e em todos os planos. Aqui, as classes proprietárias rurais são parcialmente hegemônicas, no sentido de manter o controle das relações externas da economia, que lhes propiciava a manutenção do padrão de reprodução do capital adequado para o tipo de economia primário-exportadora. Com o colapso das relações externas, essa hegemonia desemboca no vácuo; mas, nem por isso, "ipso facto" entram em ação mecanismos automáticos que produzissem a industrialização por "substituição de importações". Estavam dadas as condições necessárias, mas não suficientes. A condição suficiente será encontrar um novo modo de acumulação que substitua o acesso externo da economia primário-exportadora. E, para tanto, é preciso adequar antes as relações de produção. O populismo é a larga operação dessa adequação, que começa por estabelecer a forma da junção do "arcaico" e do "novo", corporativista como se tem assinalado, cujo epicentro será a fundação de novas formas de relacionamento entre o capital e o trabalho, a fim de criar as fontes internas da acumulação. A legislação trabalhista criará as condições para isso. Um dos seus requisitos estruturais é o de manter as condições de reprodução das atividades agrícolas, não excluindo, portanto, totalmente, as classes proprietárias rurais nem da estrutura do poder nem dos ganhos da expansão do sistema. Como contrapartida, a legislação trabalhista não afetará as relações de produção agrária, preservando um modo de "acumulação primitiva" extremamente adequado para a expansão global. Esse "pacto estrutural" preservará modos de acumulação distintos entre os setores da economia, mas de nenhum modo antagônicos, como pensa o modelo cepalino. Nesta base é que continuará a crescer a população rural ainda que tenha participação declinante no conjunto da população total, e por essa "preservação" é que as formas nitidamente capitalistas de produção não penetram totalmente na área rural, mas, bem ao, contrário, contribuem para a reprodução tipicamente não-capitalista. Assim, dá-se uma primeira "especificidade particular" do modelo brasileiro, pois, ao contrário do "clássico", sua progressão não requer a destruição completa do antigo modo de acumulação.

Esta transição ocorre num contexto em que o domínio da oligarquia latifundiária e do capital monopolista estrangeiro se torna cada vez mais insuportável, como se explicitou nas grandes greve de 1917-1920, na guerra camponesa do Contestado, na Coluna Prestes, levantes populares e com a própria Revolução de 30. Com esta última a situação da burguesia brasileira começou a mudar. Incapaz de assumir uma posição hegemônica na sociedade (como também não tinha a intenção de obter tal façanha) a burguesia brasileira relegou ao Estado o papel de agente central do processo de modernização. Isso não quer dizer que a burguesia brasileira tenha ficado fora dos assuntos da política nacional. Ao contrário, apesar de sua origem servil, a burguesia brasileira foi inegavelmente ativa após 1930. Os conflitos entre frações regionais e setoriais da burguesia brasileira, que se aguçavam nos anos 1920, acabaram resultando em uma revolução política que, mais do concluir, abriu um período de lutas associadas ligadas à nova configuração do desenvolvimento capitalista no país, modificou a relação entre Estado e economia, e mesmo das relações entre capital e trabalho. As pressões sociais vinham de agitações operárias, do descontentamento das novas camadas urbanas, o crescente envolvimento dos militares na política e a inquietação no campo por sitiantes, colonos, caboclos e outros. Por outro lado, setores agrários ligados ao mercado interno queriam ganhar espaço no jogo político contra o federalismo presidido pelos setores agroexportadores. Foi nesse contexto que Antônio Carlos falou “façamos a revolução, antes que o povo a faça”.

Vai se formando um bloco que unia diferentes forças políticas, contando com os interesses da cafeicultura, da burguesia industrial emergente, a burocracia política e profissional nascente no próprio seio do Estado, trabalhadores urbanos e setores da velha oligarquia voltados para o mercado interno. Mas porque a oligarquia dissidente que assume a predominância política encaminhará um projeto reformador do Estado colocando o Brasil na esteira da industrialização? Weneck explica este paradoxo pelos pontos convergentes, como as demandas por diversificação do aparato produtivo e pela ampliação do sistema de participação política. Embora a indústria estivesse em pleno desenvolvimento, a base agrária continuava a comandar os movimentos da econômica brasileira, apesar do consenso em fortalecer o mercado interno e ampliar as bases da atuação estatal. Desse modo, o trabalhador rural não poderia desfrutar dos mesmos benefícios que os trabalhadores urbanos, pois da sua produção dependia grande parte da economia nacional, ou ao menos uma parte grande o suficiente para impedir que os direitos trabalhistas se circunscrevessem também a eles. Estas contradições demonstraram que “depois de uma fase em que os seus representantes estiveram quase totalmente fora do poder, após 1930 ela ganhou paulatinamente ascendência sobre os governantes e fez-se ouvir nas decisões da política econômica” (Ianni, 1989, p. 91). Nesse período o Estado se manteve como o “mais importante centro de decisão” na política de desenvolvimento nacional, contudo, longe de demonstrar passividade em sua relação com as esferas de poder e não almejar a conquista da hegemonia no interior da sociedade brasileira, o empresariado fabril se empenhou na tarefa de impor a sua dominação de classe ao conjunto social. Conforme observa Ianni, “essa burguesia não está ausente na formulação das diretrizes governamentais, para incentivo direto e indireto da economia. Ainda que muitas vezes aparentando timidez ou falta de discernimento, a burguesia industrial assume de modo crescente as suas possibilidades de atuação sobre a política econômica estatal”. Desta forma, a burguesia “define de modo claro suas relações com o Estado”, às vezes infiltrando-se no aparelho estatal, outras fazendo-o operar em seu benefício, procurando converter as relações de produção em relações de dominação de classe. Conforme observa Ianni, a marcante presença do Estado na economia brasileira seria também algo desejado pelo empresariado industrial, que via o planejamento e a disciplinarização econômica exercidos pelos órgãos oficiais como fatores em si positivos para a produção. Enfim, para Ianni, a expansão do capitalismo industrial no país não foi um processo forjado monoliticamente pelo Estado. Pelo contrário, teria sido o resultado de um largo e crescente convívio entre a burguesia industrial e o poder público. Depois da Revolução de 1930, paulatinamente, os membros dessa burguesia nascente procuraram interferir nas decisões do governo, no sentido de estimular-se a industrialização e planificar-se o desenvolvimento econômico nacional. Quando as transformações da estrutura econômica abriram possibilidades de ampliação e diversificação da produção industrial, a burguesia industrial nascente, os técnicos e o governo perceberam que o aparelho estatal precisava ser convertido em conformidade com a nova situação, favorecendo-a. As possibilidades de desenvolvimento das forças produtivas somente poderiam ser aproveitadas em maior escala através da reorientação da política econômica do Estado. E foi o que preconizou a própria liderança empresarial, juntamente com os governantes (1989, p. 94).

A revolução burguesa durante a Era Vargas demonstrou que no correr dos tempos a burguesia se transforma. Em 1930 a burguesia brasileira chega ao poder na garupa das oligarquias dissidentes, o que modifica substancialmente as relações entre classes e frações de classe, e entre Estado e economia, ajudando a redefinir a via de desenvolvimento capitalista no Brasil em direção ao mercado interno, à integração regional, à industrialização e à sociedade urbana de massas. A crise econômica e o processo político que levou à Revolução de 1930 direcionaram ao novo governo um conjunto de solicitações novas, exigindo graus de liberdade para a ação econômica do Estado no sentido da incorporação de novas funções, da centralização federal e de modernização do aparato administrativo com gastos crescentes à medida que inúmeras instituições universais ou setoriais eram criadas ou reformuladas. Como desdobramento da Revolução de 1930, a união federal assumiu tarefas novas na regulação de setores econômicos e na reprodução das relações sociais, com uma intervenção crescente, por exemplo, sobre preços, salários, relações de trabalho, sindicatos patronais e trabalhistas, sistema educacional e de saúde, rede de transporte, infraestrutura básica e mesmo produção direta de insumos (Draibe, 1985). Neste período surgiu com espantosa rapidez todo um arcabouço de instituições de regulação e controle das atividades econômicas do país, que serviria de base para a constituição do Estado capitalista no Brasil. Foram criados seis órgãos de planejamento com atribuições de alcance nacional: o Departamento de Administrativo do Serviço Público (DASP); o Conselho Federal do Comércio Exterior (CFCE); o Conselho Técnico de Economia e Finanças (CTEF); a Coordenação de Mobilização Econômica (CME); o Conselho Nacional de Política Industrial e Comercial (CNPIC) e a Comissão do Planejamento Econômico (CPE). A burguesia industrial brasileira também ganhou musculatura neste período, em especial pelo processo de substituição dos bens manufaturados que antes eram importados pela produção nacional e pela a criação de diversas empresas estatais. A indústria desta época se concentrava, basicamente, na produção de bens de consumo que exigiam máquinas e equipamentos comuns, destacando-se as indústrias alimentícias, farmacêuticas, metalúrgica, artigos de higiene e limpeza, perfumaria, entre outras. Como resultado desta expansão, verificou-se que em 1935 a produção industrial foi 27% maior que a de 1929, chegando a ser 90% maior que a de 1925. Em termos absolutos, nos anos de 1920 foram criados 4.697 estabelecimentos industriais, enquanto que na década seguinte foram criados 12.232. Antes de 1940 o valor da produção industrial já é superior ao da produção agrícola sob o domínio do latifúndio capitalista.

É por isso que, para Florestan Fernandes, o que a Revolução Burguesa no Brasil tem de específico é que, diferentemente das revoluções burguesas clássicas, ela não constitui apenas num momento político, em que a burguesia toma de "assalto" o controle de poder e do Estado, mas sim, um processo de transformação continuada, em que, ao mesmo tempo, tanto se constrói a estrutura econômico-industrial, como se formam e se diferenciam as classes sociais e as estruturas políticas do próprio Estado. Na verdade, aos nossos olhos, a revolução burguesa no Brasil é uma revolução sem revolução e sem burguesia. Não é uma “revolução”, mas arranjos de cúpula, de “cima para baixo”. Nem é “burguesa”, pois é o Estado quem a dirige.

É claro que mesmo que a burguesia industrial não tenha feito “politicamente” a Revolução de 1930, logo percebeu que o novo caminho seguido pela sociedade os tornava fração dominante entre as classes dirigentes. Seu progresso representava o progresso de todos, em especial do mercado interno. A partir da expansão industrial nas décadas de 30 e 40, a burguesia industrial brasileira consegue, a partir da década de 1950, estabelecer sua própria dominação à reboque nas mudanças no capitalismo mundial após a Segunda Guerra Mundial. De resistência à industrialização dos países dependentes, a burguesia monopolista estrangeira passa a atuar para o desenvolvimento industrial destes países. Agora não temos apenas sistemas produtivos capitalistas nacionais articulados com sistemas comerciais e financeiros internacionais. Ocorre a emergência de corporações transnacionais que, em especial no governo Jucelino (1956-60), ocupam setores industriais estratégicos e o capital estrangeiro transforma-se no principal elemento do desenvolvimento industrial no Brasil. A crescente exportação de elementos do modo de produção dos países mais avançados amplia o poder burguês, incluindo o capitalismo local, num rápido processo de modernização dos meios de comunicação e transporte, ampliação de indústrias existentes e implantação da indústria automobilística, de tratores, construção naval, mecânica pesada, cimento, papel e celulose, ao lado da triplicação da capacidade da siderurgia e a base de uma indústria de bens de produção. Neste processo grande parte da burguesia cresceu, inclusive com a nacionalização da burguesia monopolista estrangeira, passando a ser uma burguesia local que explorava diretamente a força de trabalho brasileira. Como a burguesia estrangeira também destruiu alguns setores da brasileira se disseminou a ideia que a “burguesia nacional” conseguiria seguir um caminho revolucionário para desenvolver-se. Triste ilusão. 

Os descontentamentos da burguesia depois de 1954 transformaram-se num efetivo golpe militar contra o povo brasileiro, contra o poder eleito e as instituições democráticas nacionais. O maior impasse da crise brasileira no século XX foi desembocar em 1964, depois de 34 anos do início da Era Vargas até Jango, passando por JK. O que marca este período é a elevação do nível de consciência social e política, o que causava horror à burguesia, e campanhas golpistas sistemáticas que vinham crescendo desde 1950-51, durante a luta pelo retorno de Getúlio Vargas ao poder, passando pela campanha político-militar para impedir a posse de JK até as novas e sucessivas tentativas de golpes dos remanescentes da “República do Galeão”. A imprensa e a Igreja propagava boatos e calúnias sobre as hipotéticas conspirações comuno-sindicalista dispostos a um golpe de Estado. Mas foi nas ruas que se manifestou o impasse da crise brasileira. Logo antes do golpe de 1964, o Brasil vivia algo como um momento pré-revolucionário, ou seja, em que mudanças estruturais na economia e sociedade brasileira tinham forte potencial para ocorrer.

Para reagir à pressão exercida pelas massas populares e compatibilizar-se com os interesses externos, a estratégia da burguesia uma contra-revolução auto defensiva. O que começara como um putsch mineiro assumido pelos generais Luiz Guedes e Olimpio Mourão às ordens do banqueiro-governador Antônio Muricy acabou com a união entre as Forças Armadas, em conjunto com certos setores conservadores e liberais da sociedade civil, com o objetivo de encerrar o governo de João Goulart (09/09/1961 a 01/04/1964) causando uma ruptura na ordem legalmente estabelecida e contrariando os princípios de obediência ao poder constituído. Passa-se então à uma associação íntima com o capitalismo financeiro internacional, bem como o Estado torna-se um instrumento exclusivo do poder burguês e, principalmente, criam-se os meios para exterminar qualquer ideia e políticas divergentes. Com o golpe militar a “via prussiana” da revolução burguesa brasileira evolui e passa a uma “via militar-fascista-civil” do desenvolvimento capitalista. Nessa época o poder estatal é organizado a partir da doutrina de “segurança e desenvolvimento”, apoiado por um poderoso bloco industrial onde predominaram os interesses da grande burguesia financeira e monopolista estrangeira.

Para impulsionar a industrialização acelerada que se pretende, torna-se imperativo preciso resolver o problema do mercado interno da força de trabalho, ampliar a quantidade de trabalhadores livres de qualquer propriedade dos meios de produção que ainda continuava no latifúndio, em terras devolutas e outros locais exercendo atividade agrícolas. Para o capital monopolista era preciso a libertação completa dos trabalhadores dos latifúndios de suas relações pré-capitalistas, isso é, modernizar o latifúndio e realizar uma vasta expropriação de camponeses pelos meios mais diversos transformando-os em trabalhadores despossuídos que tivessem a necessidade de vender sua força de trabalho para sobreviver. Dessa forma, como escreve Wladimir Pomar, “a burguesia mantém sua aliança com os latifundiários, mas obriga-os a modernizar-se. Consegue produzir, assim, uma rápida concentração e centralização de capital, modernização das forças produtivas e expropriação dos camponeses e parcelas significativas da pequena burguesia urbana. E transforma o Estado no famoso Leviatã que subordina toda a sociedade à lógica do capital monopolista”. Montou-se um sistema produtivo baseado no grande capital monopolista, apoiado pelo crescimento do investimento público, particularmente das empresas estatais. Como nota M. C. Tavares, os governos militares consideravam imprescindível para o desenvolvimento nacional o aprofundamento da coexistência entre empresas públicas, estrangeiras e nacionais (o chamado tripé da economia brasileira) para criar um “novo” padrão de reprodução do capital. Para manter este padrão de dependência externa houveram mudanças no sistema financeiro, o que levou a  uma substancial  elevação das  receitas  fiscais  passando pelo  crescimento da dívida  pública e um certo afrouxamento da legislação sobre o capital estrangeiro.

            Na metade dos anos 1970 este modelo começa entrar em crise. É o fim do auge do via autoritária de desenvolvimento encabeçada pela burguesia brasileira junto com o capital monopolista estrangeiro e o latifúndio numa escalada de perseguições, torturas e mortes sem precedentes da história da revolução burguesa. Foi necessário mais de vinte anos de ditadura militar-civil para que as forças populares do país deixassem que acreditar que a “burguesia nacional” tivesse papel revolucionário ou que a via democrática poderia ser construída pela burguesia brasileira. O esgotamento da ditadura desembocou no fortalecimento do movimento social e do campo popular, com a fundação do PT, CUT e MST, além da mobilização popular que precedeu a Assembleia Constituinte. Mesmo assim, com a redemocratização a sociedade brasileira já havia sido expurgada das lideranças sociais e movimento políticos mais capazes. A crise da dívida externa, de 1981 a 1983, abriu um período em que a burguesia e seus lacaios buscaram de toda forma limitar por toda a década a redemocratização ao plano político-jurídico. Este impasse só foi resolvido, finalmente, com a eleição de Collor contra Lula em 1989. Na verdade, a década de 1990 se iniciou em 1989, quando a burguesia se une em torno da via de desenvolvimento neoliberal. Após a crise da dívida, diversas tentativas de estabilização inflacionária, fracassos dos planos econômicos, o projeto neoliberal vai ganhando espaço político no país.  As orientações neoliberais foram acolhidas por amplos setores da sociedade brasileira, de governantes e empresários a lideranças do movimento popular e sindical e intelectuais. 

Com a derrota de Lula e Brizola, Collor encabeça um novo pacto de elite, agora não contra a ditadura, mas contra o Estado e a regulação econômica. Como vimos, desde 1930, na Era Vargas, houve um pacto entre os capitais estatais e os capitais privados, tanto nacionais quanto estrangeiros. Ao longo do tempo, a participação do capital estrangeiro variou, as vezes por crises internacionais, por movimentos sociais pela estatização de setores econômicos ou ainda por disputas internas entre os próprios segmentos capitalistas. O período JK foi marcado por um ingresso intenso de capitais estrangeiros, embora acompanhado pelo fortalecimento relativo dos capitais estatais e privados nacionais. O regime militar, nascido com um forte discurso anti-desenvolvimentista-estatal, paradoxalmente ficou marcado por uma abertura ainda maior à entrada de capitais externos, mas também por um intenso processo de criação de novas estatais. Já “longa década” de 1990, aberta por Collor e ampliada por FHC, se baseou em quatro pontos: abertura econômica, desestatização, desregulamentação e flexibilização das relações de trabalho. O Estado deveria limitar-se a promover os interesses do mercado, garantir a “lei e a ordem” e os contratos privados. Se exigia que o Estado se retirasse das atividades diretamente produtivas e financiasse as fusões patrocinadas pelas grandes corporações transnacionais.

Como nota Wladimir Pomar, o modelo neoliberal, de Collor à FHC, entre 1989 e 2002, caracterizou-se pela tentativa de quebra do antigo pacto, com uma política voltada para a privatização das estatais e de ativos privados nacionais, na expectativa de que poderíamos viver na “nova ordem mundial”, fundada em serviços e na informática. Neste período a participação dos capitais estrangeiros na economia brasileira cresceu muito e de maneira muitas vezes nitidamente corrupta. A novidade deste modelo é que, ao contrário da antiga participação, em que os capitais privados estrangeiros construíam novas plantas e, portanto, colaboravam de maneira ativa para a transferência de elementos do modo de produção capitalista para o Brasil, durante o período Collor-FHC os capitais estrangeiros eram estimulados a comprar empresas já em funcionamento, mesmo que fosse para fechá-las e evitar que continuassem como competidores indesejáveis. Grande parte das empresas estatais foi vendida, principalmente a multinacionais, para fabricar apenas produtos de alta lucratividade no mercado externo, como ocorreu com as siderúrgicas. Inúmeras plantas privadas também foram vendidas para capitais externos. Muitas delas foram fechadas e seus equipamentos transferidos e relocalizados em países de força de trabalho mais barata, como aconteceu com diversas indústrias químicas, que tornaram o Brasil de produtor em importador. Limitação de investimentos e de novas atividades, sucateamento da infraestrutura, fragmentação das cadeias produtivas, desintegração de parte substancial do parque industrial e expansão e favelização da pobreza e da miséria resultaram das ações de economia política que procuraram incluir o Brasil na globalização capitalista como território submisso ao capital transnacional.

A dependência estrita dos fluxos financeiros internacionais, a interdição dos sentidos desenvolvimentistas do Estado brasileiro na economia por meio da privatização e da desregulamentação, a maximização das vantagens do rentismo através de uma super-ortodoxia monetarista do Banco Central, o debilitamento do setor produtivo nacional e, principalmente, a corrosão das bases sociais das classes trabalhadoras, com a crescente marginalização social dos pobres, compunham o pano de fundo das vitórias políticas do neoliberalismo no Brasil nos anos 1990. No campo, os tempos foram de maximização dos poderes econômicos do agronegócio e de pressão sobre as bases produtivas da agricultura familiar, além da criminalização dos movimentos de luta pela terra.

            Assim as corporações estrangeiras e nacionais aumentaram, e muito, sua participação na economia brasileira e na apropriação da riqueza por ela gerada, enquanto segmentos médios e pequenos inteiros foram desestruturados, e o mundo do trabalho, esse setor da sociedade que é a raiz de qualquer sistema econômico, foi fracionado, desorganizado e dispersado. Houve uma ampla desarticulação das cadeias produtivas, aumentando a desnacionalização da riqueza e o alastramento das massas marginalizadas. O desmonte e desnacionalização da parte nacional do parque produtivo do país abriu espaço para a ação da concorrência externa intensificar aquilo que hoje se proclama como especialização regressiva, perda dos setores mais avançados tecnologicamente, esgarçamento das cadeias produtivas e desindustrialização, levando a uma crise econômica, social e política sistêmica, da qual ainda não saímos.

Do tripé da economia nacional passamos para um modelo de um só pé, onde passamos a ser ainda mais dependentes do que antes dos humores da economia internacional, e apostam todas nossas fichas nas virtudes dos mercados desregulados capazes, segundo eles, de fazerem uma correta, eficiente e equilibrada alocação dos recursos provenientes dos investidores privados, sobretudo os internacionais.

Do ponto de vista da revolução burguesa no Brasil, o neoliberalismo (e tudo que veio junto com ele, desde o Plano Real até a crise de 1999) é uma vergonha ou uma farsa, cujo avesso do “renascimento” proposto por FHC foi o efêmero crescimento, a ampliação dos déficits constantes da balança de pagamentos e os juros altos como opção para atrair capital estrangeiro, cortes dos gastos públicos, restrições de oferta de crédito e as privatizações que acabou por fragmentar as atividades estatais, descapitalizar as empresas, estagnar investimentos e à perda generalizada da capacidade competitiva do país. O neoliberalismo apenas reafirmou o caráter predatório da burguesia brasileira que quase cometeu suicídio, destruindo as bases da burguesia industrial, comercial e financeira. Na verdade, de Collor a FHC, nesta década mais que perdida, vivemos uma megaoperação de pilhagem do patrimônio brasileiro cujo resultado é até hoje difícil dimensionar pelos prejuízos irreparáveis que suas medidas causou e continua causando ao conjunto do sistema produtivo nacional.

            Ao sair do governo, FHC deixou ao sucessor e as novas gerações a economia brasileira num profundo processo de endividamento, estagnação e devastação da economia nacional com a ampliação do poder do capital monopolista estrangeiro. Esta foi a principal razão para que nas eleições de 2002 o candidato para continuar este programa, José Serra, foi derrotado por Lula.